UN MINUTO DE SILENCIO POR UNA MUJER TRANSEXUAL
Holá, soy Berenice. Desde hace algunas semanas que
tengo ganas de "hablar" un poco con vosotros. Soy
brasileña y he hecho mi investigación para mi tesis
doctoral acerca de la transexualidade. Bueno, ahora
estoy enviandoles un artículo mío que ha salido hoy
en la prensa nacional. Discute un caso de una mujer
trans, Gilberta, brasileña que ha sido brutalmente
muerta en Portugal.
Saludos trans.
Um minuto de silêncio
Berenice Bento(20/06/06)
A brasileira Gilberta foi brutalmente assassinada em
Portugal, na cidade do Porto. Seu corpo foi encontrado
num poço com dez metros de profundidade. O fato
aconteceu há quatro meses e os culpados (já
identificados) continuam livres. Finalmente, depois de
muita pressão, o Parlamento Europeu aprovou resolução
em que recomenda às autoridades portuguesas uma
rigorosa apuração do caso e punição dos condenados.
“Tortura e homicídio terríveis” é como os
eurodeputados classificam o crime de que Gilberta foi
vítima.
Quem a matou? Um homem? Dois homens? Não. Quinze
adolescentes a torturaram durante horas, abusarem de
seu corpo de todas as formas e, depois, a jogaram num
poço. O laudo pericial apontou como causa da morte
afogamento. Ou seja, ela ainda estava viva quando foi
atirada no poço. Por que a morte de Gilberta não
repercutiu no Brasil? Por que o silêncio? Por que
tanto ódio?
E quem era Gilberta? Como tantas brasileiras, Gilberta
saiu do seu país para trabalhar, economizar, voltar ao
Brasil, comprar uma casa para a família e “tocar sua
vida”. Uma mistura de sonho e desejo que, como se
sabe, leva milhares de brasileiros/as para fora do
país. A história de Gilberta, no entanto, se distingue
das demais quando sabemos que ela era uma mulher
transexual, portadora do vírus HIV/AIDS, pobre e que
vivia nas ruas.
Maio de 2004. O Governo Lula lança o Programa Brasil
Sem Homofobia – conjunto de ações que visa a combater
todas as formas de preconceitos contra transexuais,
travestis, lésbicas e gays. Essa foi a primeira vez
na história que um governo tomou para si a tarefa de
combater os preconceitos por orientação sexual e de
gênero. Bela iniciativa.
Voltemos à inaceitável morte de Gilberta: se o governo
toma para si o combate à homofobia, à lesbofobia e à
transfobia, o que a Embaixada do Brasil em Portugal
está fazendo para apurar o assassinato de Gilberta?
Quais são as medidas tomadas e quais os motivos de
tamanho silêncio?
São corriqueiras as notícias de brasileiras
transexuais assassinadas em países estrangeiros – e,
como se sabe, no Brasil também – sem que o governo
brasileiro exija das autoridades locais a apuração e a
punição dos culpados. Acaba-se produzindo uma
hierarquia das mortes: algumas merecem mais atenção do
que outras. Um dos critérios para se definir a posição
que cada assassinato deve ocupar na hierarquia dos
operadores do Direito é a conduta da vítima em vida.
Nessa cruel taxonomia, casos como o de Gilberta ocupam
a posição mais inferior. É como se houvesse um
subtexto a nos dizer: “quem mandou se comportar
assim”. Essa taxonomia, em realidade, acaba (re)
produzindo uma pedagogia da intolerância. E, assim,
nessa lógica absurda, a vítima se transforma em ré.
Para garantir que as coisas fiquem como estão, há um
processo medonho de esvaziar a vítima de qualquer
humanidade. Seguindo essa lógica, a possibilidade de
se reivindicar direitos humanos se restringe a um
grupo muito reduzido de sujeitos que têm atributos que
o lançam ao topo da hierarquia: são heterossexuais,
brancos, homens masculinos, membros da elite
econômica/intelectual/política. Conforme o grau de
afastamento desses pontos qualificadores de
humanidade, reduz-se a capacidade do sujeito entrar na
esfera dos direitos e de reivindicá-los. Os direitos
humanos se transformam, nesse processo, num arco-íris:
lindo de se ver, impossível de se alcançar.
Quantas Gilbertas já morreram? Não sabemos. Não temos
dados precisos. Sabemos que as mortes por crimes de
homofobia, transfobia e lesbofobia não chegam a se
constituir em processos criminais. Poucos/as
assassinos/as chegam aos bancos dos réus, e quase
nunca há condenação por esse tipo de crime. Lembro de
uma amiga transexual que foi estuprada por um
conhecido vereador de sua cidade. Essa violação, como
tantas outras, jamais aparecerá em qualquer
estatística. Por quê? “Se eu fosse na delegacia eu é
que ficaria presa”, ela nos explica com clareza
estonteante.
Nesse mês de junho, em vários países do mundo as ruas
são ocupadas pelas cores da diversidade. São dias de
festa e de luta. Transexuais, travestis, gays,
lésbicas, bissexuais, cantam, se beijam, festejam e
lutam pelo direito pleno à vida.
Nas manifestações do mês da luta pela diversidade
sexual e de gênero, seria frutífero que, entre uma
canção da Madonna e da Glória Gaynor, lembrássemos
nossos/as mártires, aqueles que provaram com a própria
vida que a humanidade é mais plural do que tentam nos
fazer crer.
Nas paradas do mês do Orgulho façamos um minuto
silêncio. Quem sabe, assim, o Estado brasileiro nos
escute e passe da ineficaz e constrangedora política
das boas intenções para a ação concreta.
Gilberta: presente!
Really amazing! Useful information. All the best.
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